Autor: Rodrigo Coura de Castro Leite
Belo Horizonte, 10 de fevereiro de 2023
A “Terra-vergonha”
Após notificar os ministérios para que encontrem alternativas para solucionar os problemas causados pelo garimpo ilegal, nas reservas indígenas Yanomamis, de acordo com o site Diário do Nordeste (2023), o atual presidente da república, Luiz Inácio Lula da Silva, esteve em Boa Vista, no sábado, 21 de janeiro de 2023, para checar a gravidade da situação, potencializada por casos de desnutrição e malária.
Foram divulgados em relatórios do Ministério dos Povos Indígenas, de acordo com o site Wikipedia (2023), que 99 crianças Yanomamis, com 5 anos de idade ou menos, faleceram devido a problemas causados pela pneumonia. Os relatórios também informaram que um total de 570 crianças da mesma etnia morreram por desnutrição, fome ou envenenamento por mercúrio, entre os anos de 2019 e 2023.
Segundo o geógrafo Estevão Benfica (2023), assessor do Instituto Socioambiental – ISA, em declaração para a redação do site do instituto, afirma que os impactos gerados pela atividade garimpeira ultrapassam ao que é observado em imagens de satélite. Para Estevão, os impactos relacionam-se também com “[…] disseminações de doenças, deterioração no quadro de saúde das comunidades, produção de conflitos intercomunitários, aumento de casos de violência e diminuição da qualidade de água da população com destruição dos corpos hídricos […]”. Para o geógrafo, o deslocamento dos garimpeiros também ajuda a proliferar doenças, entre uma e outra região.
A evolução dos casos de malária, nas terras indígenas Yanomamis, segundo o ISA (2023), baseado nos dados do Sivep Malária – sistema de monitoramento do ministério da saúde – no ano de 2021, registrou-se 21.883 casos de infecção com a doença, o maior já registrado desde 2003.
De acordo com o site Diário do Nordeste (2023), o Ministério da Saúde já decretou estado de emergência, em Roraima, Estado onde os Yanomamis residem. Foi criado um Comitê de Coordenação Nacional com o objetivo de discutir ações para atender as comunidades impactadas, como: instalação de hospitais de emergência, distribuição de mantimentos entre outras.
Segundo o site Carta Capital (2023), de acordo com a ministra do meio ambiente, Marina Silva, em declarações dadas na segunda feira, 06 de fevereiro, antes da posse do Presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES, Aloizio Mercadante, no Rio de Janeiro: “Tem coisas que não podem ser reparadas. Como reparar uma vida? Como reparar crianças desnutridas? Como reparar crianças que foram estupradas e estão grávidas?”. Segundo o Carta Capital, a ministra afirmou que a “atrocidade inominável” contra os índios Yanomamis, em Roraima, foi induzida pelo último mandato presidencial.
Segundo o site Wikipedia (2023), verbas do mandato anterior ao do atual presidente da república, destinadas a ONG´s de fachada e ao transporte de auxílio médico para a região habitada pelos Yanomamis poderiam ter sido desviadas para empresas de transporte de propriedade dos próprios garimpeiros ilegais, propiciando, também, vazamento de informações sobre operações policiais programadas, na região.
A “Terra-floresta”
Para os Yanomamis, a “Terra-floresta” não é apenas um espaço físico. Para eles, é uma entidade caracterizada pela dinâmica de relações intercambiadas entre humanos e não humanos. Segundo o líder Davi Kopenawa Yanomami, para a redação do site Povos Indígenas no Brasil – PIB (2023):
“A terra-floresta só pode morrer se for destruída pelos brancos. Então, os riachos sumirão, a terra ficará friável, as árvores secarão e as pedras das montanhas racharão com o calor. Os espíritos xapiripê, que moram nas serras e ficam brincando na floresta, acabarão fugindo. Seus pais, os xamãs, não poderão mais chama-los para nos proteger. A terra-floresta se tornará seca e vazia. Os xamãs não poderão mais deter as fumaças-epidemias e os seres maléficos que nos adoecem. Assim, todos morrerão.” (YANOMAMI, Davi K. para o site do PIB, 2023. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Yanomami.)
Considerando a definição de Patrimônio Cultural, segundo Helena Barranha (2016), como sendo o conjunto de bens herdados do passado pelos quais os indivíduos se identificam, independentemente da situação de propriedade, sendo um reflexo de seus valores, crenças, tradições e saberes, em contínua evolução e de suas interações com outros indivíduos, culturas e lugares, ao longo do tempo, a “terra-floresta” faz parte do Patrimônio Cultural e Natural dos Yanomamis pois, além de fonte de recursos, de acordo com o site do PIB (2023), também é considerada como uma “Entidade viva” e símbolo imaterial de fertilidade, para este povo.
Os animais são “avatares” de antepassados míticos, condenados à forma animalesca, em função de comportamentos inadequados. Já nos confins da terra, nas suas colinas ou cursos d´ água, vivem escondidos os seres maléficos que provocam as doenças e as mortes. Para os Yanomamis, os espíritos foram deixados na terra por Omama, para que tomassem conta dos seres humanos. No fundo das águas, encontra-se o monstro Teperesik, sogro de Omama e a irmãs dos Yawariomas, que seduzem e enlouquecem os caçadores Yanomamis mais jovens, quando estes iniciam sua jornada xamânica. De acordo com o Dicionário Informal (2023), Omama deu origem às regras sociais e culturais dos Yanomamis, no entanto, seu irmão “ciumento e malvado”, Yoasi, deu origem à morte e aos males mundanos.
Sendo assim, o papel dos pajés é de extrema importância para a comunidade Yanomami, ao serem o reflexo da sua própria cultura, autenticando-a. Segundo Helena Barranha (2016), uma cultura, para ser considerada autêntica, deve possuir a capacidade de expressar seus valores culturais, através de objetos materiais ou de valores imateriais, apresentando-os de forma credível e contextualizados culturalmente. Desde sua iniciação, quando inalam por muitos dias um pó alucinógeno, os pajés passam a aprender a ver e conhecer os espíritos ou, xapiripês, e a responder a seus cantos, representados por apresentações de danças, “ricamente adornados, numa festa intercomunitária”.

Foto: Comemoração dos 30 anos de homologação da Terra Indígena Yanomami, na aldeia Xihop, no estado do Amazonas. Foto de Christian Braga/ISA (Instituto Socioambiental). Disponível em: https://www.socioambiental.org/noticias-socioambientais/o-futuro-e-indigena-na-terra-floresta-yanomami)
Após os rituais de iniciação, de acordo com o site do PIB (2023), os pajés podem chamar os espíritos para que estes os auxiliem, tornando-se escudos protetores contra poderes maus, originados por humanos ou não-humanos. Podem controlar a fúria dos trovões e ventos, o dia e a noite, a seca e as chuvas, a abundância das caçadas, a “fertilidade das plantações”, sustentam os céus, afastam entidades sobrenaturais, contra-atacando-as e, finalmente, curam os doentes de males humanos e não-humanos. Possuindo um sistema de caracterização diferente da maioria das sociedades modernas, os povos indígenas e, em particular, os Yanomamis, buscam, também nos rituais simbólicos, maneiras de lidar com as situações de risco.
Para que possam ver os espíritos, de acordo com o PIB (2023), os pajés inalam o pó alucinógeno. Para os Yanomamis, ao ingerí-lo, “morrem”, para depois entrarem em transe, quando podem chamar os espíritos, passando a comportar-se como eles em coreografias e cantos. Ao terem acesso à sua própria “essência”, passam a ter o poder de desenvolver ou modificar sua própria história, tornando-se agentes mantenedores da integridade do significado cultural de sua coletividade. Identificando e retransmitindo valores estéticos, históricos, científicos, sociais e espirituais para gerações passadas, presentes e futuras, afirmam sua identidade cultural, tanto para sua própria comunidade, como para os outros grupos sócias, étnicos, religiosos ou linguísticos.
Outra curiosidade cultural sobre os Yanomamis, segundo o site Diário do Nordeste (2023), é sobre a preferência pelo casamento entre primos, para que as futuras gerações continuem compartilhando laços consanguíneos e de afinidades.
A “Terra-solidária”
Ajude a comunidade dos índios Yanomamis a passar por esta crise, com menos sofrimento e mais dignidade.
Seja solidário. Procure por um canal confiável de doação ou de voluntariado e faça a diferença no contexto social da sua história.
Os índios Yanomamis, com certeza, serão eternamente gratos.
Referências Bibliográicas:
– BARRANHA, Helena (Org.). Patrimônio Cultural: conceitos e critérios fundamentais. 1ª edição – IST Press e ICOMOS: Lisboa/PT. 2016.
– CARTA CAPITAL. Marina diz que situação dos yanomami é ‘atrocidade’ induzida pelo governo Bolsonaro. Coluna Carta Expressa de 06 de fevereiro de 2023. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/marina-diz-que-situacao-dos-yanomami-e-atrocidade-induzida-pelo-governo-bolsonaro/. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.
– DIARIO DO NORDESTE. Por Redação. O que aconteceu com os Yanomami? Entenda a crise que vive povo indígena. Disponível em: https://diariodonordeste.verdesmares.com.br/ultima-hora/pais/o-que-aconteceu-com-os-yanomami-entenda-a-crise-que-vive-povo-indigena-1.3326490. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.
– DICIONÀRIO INFORMAL Yanomami. Disponível em: https://www.dicionarioinformal.com.br/yanomami/#:~:text=A%20Omama%20%C3%A9%20atribu%C3%ADda%20a,e%20dos%20males%20do%20mundo. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.
– POVOS INDÌGENAS DO BRASI – PIB. Kami Yamaki Urihipë, Nossa Terra-Floresta. Disponível em: https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Yanomami. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.
– WIKIPEDIA. Genocídio Ianomâmi em 2022-2023. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Genoc%C3%ADdio_ianom%C3%A2mi_em_2022-2023. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.
– WIKIPEDIA. Línguas Ianomâmis. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/L%C3%ADnguas_ianom%C3%A2mis. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.
– WIKIPEDIA. Terra Indígena Yanomami. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Terra_Ind%C3%ADgena_Yanomami. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.
Fotografia:
– BRAGA, Christian. Arquivo Fotográfico do Instituto Socioambiental – ISA. Disponível em: https://www.socioambiental.org/noticias-socioambientais/o-futuro-e-indigena-na-terra-floresta-yanomami. Acesso em 09 de fevereiro de 2023.